Pesquisa do Ipea foi elaborada com dados da Pnad Covid-19
Os profissionais com nível superior completo possuem 23% a mais de chance de estarem em trabalho remoto do que as pessoas com escolaridade de nível fundamental incompleto. Esta foi uma das conclusões do estudo Um Panorama do Trabalho Remoto no Brasil e nos Estados Brasileiros durante a Pandemia da Covid-19, elaborado pelos pesquisadores do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Geraldo Góes, Felipe Martins e José Antônio Nascimento.
O estudo analisa dados mensais sobre gênero, raça/cor, escolaridade, idade, setor de atividade, percentual da massa de rendimentos por atividade econômica para o Brasil e em cada um dos estados brasileiros, que foram registrados de maio a novembro de 2020, no período em que Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Covid-19.
“Poucos países no mundo, que a gente tem notícia, como Inglaterra e Índia, fizeram esta pesquisa durante a pandemia. Então, podemos calcular aquelas pessoas que efetivamente estavam exercendo trabalho remoto e não apenas do ponto de vista potencial”, disse o pesquisador Geraldo Góes, em entrevista à reportagem.
A análise do Ipea apontou que 7,3 milhões de pessoas trabalharam de forma remota no Brasil, de maio a novembro de 2020. O número representa 9,2% da população ocupada e não afastada, sendo responsável por 17,4% da massa de rendimentos gerada via trabalho.
O perfil médio dos trabalhadores em home office em novembro de 2020 é, na maioria, formada por mulheres (57,8%), pessoas que se declaram brancas (65,3%), com escolaridade de nível superior completo (76%), na faixa de 30 a 39 anos (31,9%) e, por fim, empregados no setor privado (61,1%).
Na avaliação dos pesquisadores, ser mulher aumenta as chances de trabalhar de forma remota em 1,5% na comparação com os homens. Na análise por raça/cor, ser branco eleva as chances de homeoffice em 2,3% em relação a negros. Se a pessoa trabalhar no serviço público, as chances de estar em remoto aumentam em 14% na comparação com as pessoas empregadas na atividade agrícola. Os trabalhadores com vínculo informal têm 0,8% menos chances de fazer teletrabalho do que os que exercem o ofício formalmente.
Para os pesquisadores, vale observar que trabalhadores em atividades de menor qualificação, como os agrícolas, artesãos, operadores de máquinas, vendedores e do comércio, praticamente não exerceram trabalho de forma remota. O mesmo ocorre com membros das Forças Armadas, policiais militares e bombeiros militares. “Esses não têm como. É muito pouca a possibilidade de realizar trabalho remoto. O setor que menos pode ter é a agricultura. Tem que estar lá lidando com a terra”, contou.
Regiões
Em um recorte regional, a pesquisa revelou que quem reside no Sudeste possui 5,6% mais chance de estar trabalhando de casa do que os moradores do Norte do país. Os pesquisadores notaram ainda que, nos fatores individuais, laborais e regionais, as mulheres, brancas, com escolaridade de nível superior completo, trabalhando no setor público, com vínculo formal e na região Sudeste chegam a ter 47,2% a mais chance de trabalharem à distância do que homens, negros, com escolaridade de nível fundamental incompleto, trabalhando na agricultura, com vínculo informal e residentes no Norte do país.
“Nós percebemos que para os estados brasileiros, aqueles com maior renda per capita eram os que tinham o maior percentual de possibilidade de trabalho remoto”, disse o pesquisador.
O estudo apresentou um dado inédito referente à massa de rendimentos por atividade econômica em cada estado brasileiro. No Distrito Federal (DF), o maior percentual de pessoas ocupadas em home office (20%), foram responsáveis por 32,7% da massa de rendimentos total efetivamente recebida pelas pessoas ocupadas no DF.
Na outra ponta, no Pará, que teve o menor percentual de população ocupada trabalhando remotamente (3,1%), essas pessoas foram responsáveis por 6,9% da massa de rendimentos total efetivamente recebida por quem estava com ocupação no estado. “Basicamente a economia do estado do Pará é minério de ferro, que é uma atividade com pouca possibilidade de exercer trabalho remoto”, disse Góes.
Os pesquisadores entendem que esses resultados deixam evidente a disparidade no trabalho remoto entre os estados brasileiros. “O tipo de emprego formal é o que tem mais capacidade de fornecer ao trabalhador um computador, uma máquina, serviços de informática, o que permite o trabalho remoto”, informou.
Na visão de Geraldo Góes, apesar de cerca de um quinto dos trabalhadores estarem em ocupações passíveis de serem realizadas à distância, apenas pouco menos de 10% efetivamente trabalharam de forma remota em novembro de 2020, conforme o último dado disponível pela Pnad Covid-19.
Ainda assim, de acordo com ele, o Brasil não está mal no ranking dos 87 países que têm potencial para realizar teletrabalho. “Comparado a outros países, a posição do Brasil não é muito ruim, não. São características do teletrabalho. No ranking o Brasil está na 45ª posição entre 87 países”, completou.
Permanência
O pesquisador acrescentou que o número de pessoas em trabalho remoto deve diminuir com o avanço da flexibilização e da vacinação e a diminuição do distanciamento social, mas ele não acredita que voltará a níveis como ocorria antes da pandemia.
“Estudos mostram claramente que vão diminuindo, mas a gente acredita que não vai cair para o nível pré-pandemia. A experiência mostrou que há uma série de fatores que podem influenciar as empresas a continuar com o teletrabalho, por exemplo, a redução de custos com aluguel de máquinas e do espaço físico, do transporte do trabalhadores, em alguns casos aumenta a produtividade, então, por isso a gente acredita que o número vai diminuir mas não chegar ao nível pré-pandemia”, observou.
Pesquisa
Góes defendeu que Pnad Contínua possa incorporar em seu questionário perguntas que possam avaliar, de alguma forma, esta nova modalidade de trabalho: “seria relevante que a Pnad Contínua tivesse esse tipo de pesquisa”, disse ao lembrar que a Pnad Covid-19 também foi executada de maneira distinta, coletando os dados de forma remota.
Edição: Denise Griesinger/Agência Brasil