Das oito linhas de produção saem prontos equipamentos para som automotivo e telecomunicação. Os presos recebem treinamento para atuar em todas as etapas de fabricação e montagem
Uma cena de surpreender qualquer um que entra no Presídio de Ribeirão das Neves I (Dutra Ladeira), na Região Metropolitana de Belo Horizonte, ocorre de segunda a sexta-feira, no horário comercial. Em um grande galpão recém-reformado, 140 presos trabalham em uma fábrica de eletrônicos, produzindo fontes, placas, controles, painéis de rede e outras peças para som de carros e o mercado de telecomunicação.
Na matriz da empresa JFA são feitos os testes e a montagem final. Dos vários itens comercializados pela empresa, somente para se ter uma ideia do volume de produção no presídio, são fabricados, diariamente, 350 placas de fontes e 1,5 mil controles de som automotivo, entre outros. Uma das linhas de montagem tem destaque especial, pela necessidade de concentração e minúcia: a área de inserção de componentes eletrônicos nas placas, que parece um quebra-cabeça colorido. Normalmente, esta etapa da produção em empresas do ramo é feita por mulheres, mas na Dutra Ladeira os homens conseguem fazer com a mesma perfeição.
Para a gerente de produção da empresa, Ismênia Alves, sempre presente nos diversos setores da fábrica, os empresários precisam conhecer o sistema prisional para entender que é possível instalar e produzir dentro de um presídio ou penitenciária com a mesma eficiência de uma fábrica funcionando do lado de fora das muralhas. “As vantagens e benefícios são para todos: setor privado, Departamento Penitenciário, presos e familiares e sociedade civil. Temos obtido ótimos resultados e com excelente qualidade”, garante Ismênia Alves.
A empresa começou a funcionar em setembro de 2019, no antigo Presídio José Abranches Gonçalves, atual Centro de Ressocialização e Pré-Soltura de Ribeirão das Neves I, e em abril de 2020 foi transferida para a Dutra Ladeira.
Reconhecimento
A finalidade maior do funcionamento da empresa dentro do presídio, a ressocialização, já traz resultados. O ex-detento Palmar Carvalho, 26 anos, trabalhou na JFA de setembro de 2019 a junho de 2020, até receber alvará de soltura. Já em julho daquele ano ele foi contrato pela empresa, e, hoje, é programador de Planejamento e Controle de Produção. Ele trabalha na matriz, responde por 100% do controle da produção de subprodutos e produtos intermediários, e está cursando Gestão da Produção Industrial. “Sou muito grato à empresa pela oportunidade, reconhecimento e todo o aprendizado. Sinto-me orgulhoso da minha nova vida.”
“Um outro talento já foi revelado na fábrica do presídio”, garante a gerente de produção Ismênia Alves. “O convite está feito, falta pouco para sair o alvará de soltura”, conta entusiasmada.
Tempero essencial
Outra frente de trabalho na Dutra Ladeira, totalmente diferente, movimenta 50 presos de segunda a sexta-feira. São duas empresas de beneficiamento de alho, que descasca, limpa e empacota dentes de alho em bandejas de isopor e sacos plásticos. No total, ao fim do mês, são 36 toneladas de alho. Tudo isto é enviado ao Ceasa, e depois distribuído para supermercados. Uma empresa começou as atividades no presídio em 2015 e a outra em 2021.
O diretor do presídio, Ronan Luiz Pinto, avalia as atividades de trabalho dos presos na unidade, seja nos eletrônicos, no beneficiamento de alho ou na manutenção e limpeza como de fundamental importância. “Elas representam uma possibilidade de maior empregabilidade no futuro, ajudam na saúde física e mental dos presos, e ainda contribuem na renda familiar, quando eles trabalham nas parcerias com empresas privadas”, explica o diretor.
Os presos atuantes nas parcerias recebem 3/4 do salário mínimo. Esses e os que exercem atividades de manutenção e limpeza têm direito à remição de pena, ou seja, um dia a menos na condenação para cada três dias de trabalho.
Crédito das imagens: Tiago Ciccarini / Sejusp